Nome para a Defesa de Lula, Múcio ?abre portas? a empresas no governo

Por Redação em 05/12/2022 às 05:46:10

HĂĄbil negociador polĂ­tico e nome forte para comandar o Ministério da Defesa na futura gestão Luiz InĂĄcio Lula da Silva, o ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) José MĂșcio Monteiro "abre portas" ao setor privado em órgãos do governo. O ministro aposentado presta, ainda, consultoria a empresas com interesses na Corte em que atuou por mais de dez anos.

MĂșcio entrou no ramo após deixar o TCU – em aposentadoria antecipada, em dezembro de 2020. No mĂȘs seguinte, abriu a Jmmf Consultoria Ltda, com capital de R$ 10 mil, em uma sala comercial na Asa Norte, em BrasĂ­lia. No registro, consta a atividade de "consultoria em gestão empresarial". Em fevereiro deste ano, inaugurou uma filial em um edifĂ­cio comercial no Recife.

Ao Estadão, MĂșcio afirmou que a consultoria faz "engenharia polĂ­tica" para clientes. "Eu uso meu network de 40, 50 anos de polĂ­tica e abro portas, marco para a pessoa ser recebida", afirmou. Ele rechaça a pecha de lobista: "Lobby é se eu cobrar por ĂȘxito. Eu não cobro por ĂȘxito. Eu não tenho premiação".

No âmbito de processos no TCU, a contratação da Jmmf Consultoria é mencionada para prestar serviços à Seguradora LĂ­der, que jĂĄ foi responsĂĄvel pela administração do DPVAT – o seguro obrigatório para motoristas -, em ao menos duas atas de reuniões a que a reportagem teve acesso. Uma delas é de 10 de agosto deste ano e a outra do dia 18 do mesmo mĂȘs.

Na Ășltima década, o TCU apurou uma série de suspeitas de irregularidades em contratos da LĂ­der na gestão do seguro usado para indenizar vĂ­timas de acidentes de trânsito, cujo montante recolhido é de R$ 4 bilhões por ano. MĂșcio foi relator de um pedido do Congresso para auditar o DPVAT, em 2018. Nenhum dos casos resultou em conclusão que levasse a seguradora a ser punida.

O presidente Jair Bolsonaro, porém, chegou a suspender a arrecadação em uma investida contra o seguro. Em 2020, o consórcio da LĂ­der foi dissolvido pelas empresas integrantes e o TCU determinou que o governo continuasse a prover o seguro, mesmo que em um contrato emergencial com a seguradora. A gestão Bolsonaro, então, passou para a Caixa Econômica Federal a administração dos recursos. O caso estĂĄ prestes a parar na Justiça, além de pendente de anĂĄlise na Corte de contas. A LĂ­der quer voltar a operar o DPVAT.

"CONSISTENTE". Em um trecho do contrato de MĂșcio com a LĂ­der consta que o ministro aposentado presta "serviços de consultoria consistente em gestão empresarial e apoio". Pessoas ligadas às seguradoras afirmaram ao Estadão que, na prĂĄtica, ele seria responsĂĄvel por pareceres nos processos que estão no TCU.

Hoje, MĂșcio disse ter contrato de R$ 50 mil com a Seguradora LĂ­der. O ministro aposentado é engenheiro de formação, não advogado, e, apesar de constar duas vezes nas atas produzidas e endossadas pelas empresas que o contrataram, ele negou atuar no TCU.

"Se eles puseram na ata, é por conta e risco deles. Mas eu não vou cuidar (dos processos). Até porque os ministros não recebem isso (a atuação de ex-ministros) bem. Nem nos meus relatórios de compliance, nem nas empresas tem nenhuma citação a lobby, nem Congresso, nem TCU, nem absolutamente nada", disse.

MĂșcio afirmou, ainda, prestar consultoria por R$ 18 mil à Federação das Seguradoras (Fenaseg). Procuradas, LĂ­der e Fenaseg não se manifestaram.

ÊXITO. No time de advogados da LĂ­der, que contratou MĂșcio, estĂĄ um amigo do ministro aposentado, o ex-correligionĂĄrio e colega de bancada do PTB de Pernambuco na Câmara Luiz Piauhylino. O Estadão teve acesso aos valores do contrato do ex-parlamentar, que pode chegar a R$ 4,8 milhões a depender do ĂȘxito nas ações.

Piauhylino tem parentesco distante com MĂșcio e, em comum, acumula vasta experiĂȘncia no TCU. Desde que deixou de ser deputado, em 2007, Piauhylino atua na Corte, especialmente para empresas do setor de infraestrutura. Também teve processos julgados pelo ministro aposentado.

MĂșcio disse ter ajudado recentemente Piauhylino a amarrar agendas com autoridades do governo, mas negou ter relação de trabalho com o ex-deputado no caso das seguradoras. "Se eu tivesse negócios com algum advogado, eu teria com meu filho, que é advogado. Mas eu fujo disso", afirmou.

Procurado, Piauhylino não se manifestou. Questionado sobre se MĂșcio tem atuado em nome de empresas, o TCU não se pronunciou.

MAIS CONTRATOS. Em outubro do ano passado, o portal UOL revelou que MĂșcio foi contratado pela fabricante de cigarros Philip Morris para atuar em nome da multinacional perante à AgĂȘncia Nacional de Vigilância SanitĂĄria (Anvisa). Na época, a empresa havia sofrido uma derrota no órgão regulador, em uma tentativa de registrar um produto relacionado a cigarros eletrônicos.

Procurada, a Phillip Morris afirmou que "confirma que o ex-ministro José MĂșcio Monteiro presta serviço de consultoria à empresa".

Assim que deixou o TCU, jĂĄ em dezembro de 2020, MĂșcio tornou-se conselheiro administrativo da FSB, agĂȘncia de comunicação com histórico de contratos no governo federal. A empresa afirmou que o "ex-ministro José MĂșcio Monteiro é consultor da FSB Comunicação na ĂĄrea de anĂĄlise polĂ­tica".

NOVA MISSÃO. Agora, na iminĂȘncia de assumir o Ministério da Defesa de Lula, MĂșcio deve deixar a Jmmf Consultoria e abandonar o mercado privado. Ele foi convidado pelo presidente eleito para comandar a pasta. O petista confirmou a interlocutores, em reuniões ao longo da semana passada, que vai anunciĂĄ-lo após ser diplomado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no próximo dia 12. MĂșcio evita falar abertamente sobre o assunto antes que o presidente eleito confirme seu nome.

O ministro aposentado deverĂĄ assumir uma pasta que representa uma das grandes dificuldades para o próximo governo. Lula e o PT tĂȘm relação truncada com a cĂșpula do Exército, onde MĂșcio circula com desenvoltura. Como mostrou o Estadão, ele virou uma espécie de "curinga" para a equipe da transição e chegou a ser cotado até para a articulação polĂ­tica.

TRÂNSITO. As credenciais de MĂșcio, seja na atuação na iniciativa privada, seja para assumir a Defesa, advĂȘm da longa carreira polĂ­tica, iniciada nos anos 1970 como prefeito de Rio Formoso (PE). Ele foi ainda secretĂĄrio de Estado, acumulou cinco mandatos de deputado federal e foi ministro da Secretaria de Relações Institucionais de Lula antes de ser indicado pelo petista ao TCU, em 2009.

O trânsito se dĂĄ não só pela esquerda. MĂșcio passou pelo extinto PDS, PFL, DEM, oriundos da Arena – partido da ditadura militar. Elegeu-se deputado em coligação com Fernando Henrique Cardoso nos anos 1990. Mais recentemente, teve proximidade com Bolsonaro e foi um dos agentes polĂ­ticos que se esforçaram para que o mandatĂĄrio abraçasse a vacina contra a covid. Não deu certo, e MĂșcio assumiu postura mais crĂ­tica ao governo. Agora, de novo, se volta para Lula.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Fonte: Isto É

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